Jacques Amaury Escreve Sobre, a Tugolândia
Artigo de: Jacques
Amaury,
Sociólogo e filósofo francês,
acerca de Portugal
Um
artigo de Jacques Amaury, sociólogo e filósofo francês, professor na
Universidade de Estrasburgo, a ler com olhos de ler.
"Portugal
atravessa um dos momentos mais difíceis da sua história que terá que resolver
com urgência, sob o perigo de deflagrar
crescentes tensões e consequentes convulsões sociais.
Importa em primeiro
lugar averiguar as causas. Devem-se sobretudo à má aplicação dos
dinheiros emprestados pela CE para o esforço de
adesão e adaptação às exigências da união.
Foi o país onde mais a CE investiu
"per capita" e o que menos proveito retirou. Não se actualizou, não melhorou as
classes laborais, regrediu na qualidade da educação, vendeu ou privatizou
mesmo actividades primordiais e património que poderiam hoje ser um
sustentáculo.
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Os dinheiros foram
encaminhados para, auto-estradas, estádios de futebol, constituição de centenas de
instituições público-privadas, fundações e institutos, de duvidosa utilidade,
auxílios financeiros a empresas que os reverteram em seu exclusivo benefício,
pagamento a agricultores para deixarem os campos e aos pescadores para venderem
as embarcações, apoios estrategicamente endereçados a elementos ou a próximos
deles, nos principais partidos, elevados vencimentos nas classes superiores da
administração pública, o tácito desinteresse da Justiça, frente à corrupção galopante e um
desinteresse quase total das Finanças no que respeita à cobrança na riqueza, na
Banca, na especulação, nos grandes negócios, desenvolvendo, em
contrário, uma atenção especialmente persecutória junto dos pequenos comerciantes e
população mais pobre.
A política lusa é um campo escorregadio
onde os mais hábeis e corajosos penetram, já que os partidos cada vez mais
desacreditados, funcionam essencialmente como agências de emprego que admitem
os mais corruptos e incapazes, permitindo que com as alterações governativas
permaneçam, transformando-se num enorme peso bruto e parasitário. Assim,
a monstruosa Função Publica, ao lado da classe dos professores, assessoradas
por sindicatos aguerridos, de umas Forças Armadas dispendiosas e caducas,
tornaram-se não uma solução, mas um factor de peso nos problemas do país.
Não existe partido de
centro já que as diferenças são apenas de
retórica, entre o PS (Partido Socialista) e o PPD/PSD (Partido Popular /Social
Democrata), de direita, agora mais conservador ainda, com a inclusão de um novo
líder, que tem um suporte estratégico no PR e no tecido empresarial abastado. Mais à direita, o CDS
(Partido Popular), com uma actividade assinalável, mas com telhados de vidro e
linguagem publica, diametralmente oposta ao que os seus princípios recomendam e
praticarão na primeira oportunidade. À esquerda, o BE (Bloco de Esquerda), com
tantos adeptos como o anterior, mas igualmente com uma linguagem difícil de se
encaixar nas recomendações ao Governo, que manifesta um horror atávico à
esquerda, tal como a população em geral, laboriosamente formatada para o mesmo
receio. Mais à esquerda, o PC (Partido
comunista) menosprezado pela comunicação social, que o coloca sempre como um
perigo latente e uma extensão inspirada na União Soviética, oportunamente extinta, e
portanto longe das realidades actuais.
Assim, não se encontrando forças capazes
de alterar o status, parece que a democracia pré-fabricada não encontra novos instrumentos.
Contudo, na génese deste beco sem aparente saída,
está a impreparação, ou melhor, a ignorância de uma
população deixada ao abandono, nesse fulcral e determinante aspecto. Mal
preparada nos bancos das
escolas, no secundário e nas faculdades, não tem capacidade de
decisão, a não ser a que lhe é oferecida pelos órgãos de Comunicação. Ora é aqui está o
grande problema deste pequeno país; as TVs as Rádios e os Jornais, são na sua
totalidade, pertença de privados ligados à alta finança, à industria e
comercio, à banca e com infiltrações accionistas de vários países.
Ora, é bem de ver que com este caldo,
não se pode cozinhar uma alimentação saudável, mas apenas os pratos que o
"chefe" recomenda. Daí a estagnação que
tem sido cómoda para a crescente distância entre ricos e pobres.
A RTP, a estação que agora engloba a
Rádio e TV oficiais, está dominada por elementos dos dois
partidos principais, com notório assento dos sociais-democratas e populares, especialistas em
silenciar posições esclarecedoras e calar quem levanta o mínimo problema ou dúvida. A selecção dos
gestores, dos directores e dos principais jornalistas é feita exclusivamente
por via partidária. Os jovens jornalistas,
são condicionados pelos problemas já
descritos e ainda pelos contractos a
prazo determinantes para o posto de trabalho enquanto,
o afastamento dos jornalistas seniores, a quem é mais difícil formatar o
processo a pôr em prática, está a chegar ao fim. A deserção destes, foi
notória.
Não há um único meio ao alcance das pessoas
mais esclarecidas e por isso, "non gratas"
pelo establishment, onde possam dar luz a novas ideias e à realidade do
seu país, envolto no conveniente manto diáfano que apenas deixa ver os
vendedores de ideias já feitas e as cenas recomendáveis para a manutenção
da sensação de liberdade e da prática da apregoada democracia.
Só uma comunicação não
vendida e alienante, pode ajudar a população, a fugir da banca, o cancro endémico de
que padece, a exigir uma justiça mais célere e justa, umas finanças atentas e
cumpridoras, enfim, a ganhar consciência e lucidez sobre os seus desígnios.
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